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Formação Intercultural para profissionais que atuam com povos indígenas oportuniza debate sobre aspectos antropológicos
03/12/2025
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A Coordenadoria de Políticas Públicas para os Povos Indígenas (CMPPI) deu início, nesta quarta-feira (3), ao projeto “Formação Intercultural – letramento e diálogo entre saberes”, destinado para equipes que atuam no atendimento de povos indígenas. A ação, realizada no Centro de Referência de Atendimento à Mulher em Situação de Violência, foi organizada em quatro módulos e, neste primeiro momento, foi abordada a questão antropológica.
A atividade foi dividida em quatro momentos para assim possibilitar o trabalho com diferentes públicos relacionados com os trabalhos com as aldeias. Na manhã de hoje, a palestra foi direcionada a membros do Conselho Municipal dos Povos Indígenas e do Comitê Intersetorial de Política Indigenista, que reúne representantes de diversos setores da administração municipal, como Meio Ambiente, Planejamento, Educação, Saúde, Programas e Projetos Especiais, entre outros.
A palestra foi ministrada pela doutora em antropologia Mariana Soares, responsável técnica da Emater em nível estadual para comunidades indígenas e uma das referências sobre o tema. Na oportunidade, ela apresentou diferentes aspectos a respeito das características culturais dos povos existentes no Rio Grande do Sul, que são, Kaingang, Guarani, Charrua e Xokleng. No Rio Grande estão presentes os povos Kaingang e Guarani.
“Não existe uma receita. Nenhum antropólogo pode afirmar ‘tal povo é assim, trabalhem assim’. É sempre desafiador, nós trabalhamos com pessoas, com culturas diferentes. Então a gente tenta conversar, ouvir as questões que tocam. É sempre um desafio trabalhar com o outro, com o diferente”, ressalta.
De acordo com Mariana, os povos indígenas foram vítimas de um longo processo de violação de direitos que tiveram impactos profundos. Isso teve início já na nomenclatura, uma vez que foram chamados de “índios”, pois os portugueses pensavam ter chegado à Índia. Em função disso, ela entende que existe uma dívida, uma necessidade de reparação enquanto sociedade. Nesse sentido, ela destaca a legislação do nosso país, que considerava o indígena como incapaz até a constituição de 1988, que definiu que os povos indígenas têm os mesmos direitos e deveres dos demais brasileiros, mas com direitos específicos.
“Após rompida a tutela e agora, como trabalhar a garantia de direito de autodeterminação? Foram centenas de anos de tutela geracional, e então a crítica é que eles querem assistencialismo. Mas como dizer ‘agora você tem autonomia”? Quais são as condições para que eles tenham autonomia, emancipação, protagonismo? É algo complexo e subjetivo, vai levar tempo para que as coisas sejam diferentes. E como vão ser diferentes sem oportunidades, sem garantia de direitos, sem políticas públicas? Não programas que surgem e acabam, mas algo que possa realmente estruturar o caminho que eles querem seguir”, afirma.
Ela também falou sobre o estereótipo criado a respeito dos povos indígenas, como se fossem todos iguais, “pelados, pintados e correndo na selva”. Considerando o contexto, ela defendeu que, ao longo dos anos, os não indígenas também tiveram grandes mudanças culturais.
“Nós nos transformamos ao longo da trajetória. Parece que os povos indígenas não podem ter mudanças culturais, como se a cultura fosse algo estático. Mas não é, ela se transforma. E por que ela se transforma? No caso dos indígenas temos que considerar a imposição, o processo histórico de anulação e violação, e tudo que o estado brasileiro fez para que eles não fossem vistos como sujeitos de direitos. Alguns povos nem estão aqui para contar sua história, porque houve genocídio. Indígena não pode ter roupa, celular, carro, casa? Perdeu a cultura? Nós também não somos os mesmos que foram os nossos pais e avós”, comenta.
A programação continua durante a tarde, em diálogo com profissionais da Saúde. Amanhã (4) a formação será ofertada para trabalhadores da Educação, da Assistência Social e conselheiros tutelares.
Para a coordenadora da CMPPI, Tatiana Freitas, a expectativa é de que os profissionais possam ter, a partir dessa formação, um conhecimento maior em relação a desmistificação dos povos indígenas e originários.
“ Fico muito feliz de estarmos oportunizando essa formação para os colegas. Pela manhã tivemos uma conversa muito boa, muito produtiva. Esperamos que os trabalhadores participem para que a gente possa evitar os mesmos erros e ter uma habilidade de pensamento maior”, diz.
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